segunda-feira, 23 de janeiro de 2023

Aborto – Lula assume a verdadeira face

 


A rejeição ao aborto no Brasil é fantástica. Mas a ideologia não está nem aí com o sentimento da maioria

Lula da Silva nunca teve compromisso com a verdade e com a coerência. Político astuto, calculista e com notável capacidade de se posicionar na linha dos ventos favoráveis, ao sentir a rejeição dos brasileiros ao aborto, deu um cavalo de pau num tema sensível: o aborto. De defensor do aborto, posição consolidada no PT, passou a empunhar a bandeira da defesa da vida.

Agora, instalado no Palácio do Planalto, sem enrubescer ou contrair um músculo do rosto, empunhou a caneta para uma promoção sem precedentes da eliminação da vida inocente. Lula assume a sua verdadeira face.

Em menos de um mês de governo, em clima de notável radicalização, decidiu, entre outras coisas, a desvinculação do Brasil com a Convenção de Genebra e a revogação da portaria que determina a comunicação do aborto por estupro às autoridades policiais. O estuprador está livre para repetir o crime.

Com o apoio explícito do Executivo, grupos favoráveis ao aborto e muito pouco democráticos já começam a ensaiar um roteiro bem conhecido: contornar o Congresso e, caso necessário, levar a questão ao Supremo Tribunal Federal (STF).

A rejeição ao aborto no Brasil é fantástica. As pesquisas estão aí. E são inequívocas. A legalização do aborto é uma agressão à sociedade. Mas a ideologia não está nem aí com o sentimento da maioria. Democracia só vale se estiver alinhada com o pensamento único de uma militância autoritária.

A legalização do aborto sempre foi uma prioridade do PT. Contra a vontade expressa da sociedade, e em nome da “democracia” e dos direitos reprodutivos, defende a eliminação do primeiro direito humano fundamental: o direito à vida.

No aborto há duas vítimas: o bebê não nascido e o coração desgarrado da mãe.

No tocante ao inegável sofrimento vivido pela gestante, reproduzo, mais uma vez, um depoimento emblemático. Trata-se da carta de uma mãe que, não obstante a dor provocada pela morte do feto anencéfalo, justificou a sua decisão de levar a gravidez até o fim. Sua carta, publicada no jornal O Globo, foi um contundente recado aos governantes.

”Fui mãe de uma criança com anencefalia e posso afirmar que durante nove meses de gestação convivi com um ser vivo, que se mexia, que reagia aos estímulos externos como qualquer criança no útero. Afirmo também que não existe dano à integridade moral e psicológica da mãe. O problema é que estamos vivendo numa sociedade hedonista e queremos extirpar tudo o que nos cause o mínimo incômodo. (...) Se estamos autorizando a morte dos que não conseguirão fazer história de vida, cedo ou tarde autorizaremos a antecipação do fim da vida dos que não conseguem se lembrar da sua história, como os portadores do mal de Alzheimer”, escreveu Ana Lúcia dos Santos Alonso Guimarães.

Trata-se de uma carta impressionante e premonitória. A autora se opunha ao aborto anencefálico. A legalização do aborto, estou certo, é o primeiro elo da imensa cadeia da cultura da morte. Após a implantação do aborto descendente (a eliminação do feto), virão inúmeras manifestações do aborto ascendente (supressão da vida do doente) – a eutanásia já está incorporada ao sistema legal de alguns países –, do idoso e, quem sabe, de todos os que constituem as classes passivas e indesejadas da sociedade.

Aprovar a autorização legal para abortar, como bem comentam os filósofos Robert P. George e Christopher Tollefsen, em seu livro Embryo: A Defense of Human Life, é dar licença para matar uma certa classe de seres humanos como meio de beneficiar outros. Defender os direitos de um feto é a mesma coisa que defender uma pessoa contra uma injusta discriminação, a discriminação dos que pensam que existem alguns seres humanos que devem ser sacrificados por um bem maior. Aí está exatamente o cerne da questão, que nada tem a ver com princípios religiosos nem com a eventual crença na existência da alma.

Hoje o que está sendo questionado não é tanto a realidade biológica, inegável, mas uma coisa muito mais séria: o próprio conceito de “humano” ou de “pessoa”. Trata-se, portanto, de uma pergunta de caráter filosófico e jurídico: quando se pode afirmar de um embrião ou de um feto que é propriamente humano e, portanto, detentor de direitos, a começar pelo direito à vida?

Fala-se, arbitrariamente, de tantos dias, de tantos meses de gravidez. E se chega até a afirmar, como já foi feito entre nós, que só somos seres humanos quando temos autoconsciência. Antes disso, só material descartável ou útil para laboratório. Mas será que um bebê de dois meses ou de dois anos tem “autoconsciência”?

Não se compreende de que modo obteremos uma sociedade mais justa, democrática e digna para seres humanos (os adultos) com a morte de outros (as crianças não nascidas).

Qualquer atentado à vida é também uma violência ao Estado Democrático de Direito. Espero que o presidente da República reveja sua posição. Mas cabe ao novo Congresso Nacional, com firmeza e em sintonia com o sentimento da maioria esmagadora da população brasileira, impedir o sombrio genocídio dos inocentes.

Carlos Alberto Di Franco - Jornalista - Publicado no Jornal "O Estado de São Paulo" em 23/01/2023

 

terça-feira, 17 de janeiro de 2023

Convertei-vos porque o Reino de Deus está próximo!

 

Quando um navio vai sair do estaleiro pela primeira vez, é costume realizar-se uma cerimônia na qual a nova embarcação recebe o nome e, como desfecho do ato, uma garrafa de champanhe é quebrada de forma espetacular no casco, escorrendo ali todo o seu precioso líquido.

Depois disso, com o costado recém-pintado, liso e completamente limpo, a embarcação é lançada na água e começa a navegar pelos oceanos. Com o passar dos anos a velocidade do navio vai diminuindo, não por perda de força do motor, mas porque no casco se incrustam moluscos em grande quantidade que dificultam a navegação. Para recuperar a rapidez inicial é imperioso retornar ao estaleiro e remover essa crosta. Também os automóveis quando são novos funcionam bem, e depois de certo tempo de uso é necessário submetê-los a uma revisão, a fim de garantir o bom desempenho de seu mecanismo.

Assim também, sobretudo nós, necessitamos fazer uma revisão… da alma. Temos de analisar com frequência nossa vida espiritual, porque, apesar de sermos batizados, recebermos os Sacramentos com assiduidade e praticarmos com seriedade a Religião, é frequente passarmos por circunstâncias que nos levam a cometer certas imperfeições ou a nos apegarmos às vaidades deste mundo, e adquirirmos manias e maus hábitos.

É por isso que, na sua extraordinária sabedoria, a Igreja distribui a Liturgia ao longo do ano de maneira a nos proporcionar, em determinados momentos, a oportunidade de fazer a nossa revisão espiritual. Um desses períodos é o Advento, tempo de conversão, ou seja, tempo de exame de consciência, de penitência e de mudança de vida. A pregação de São João Batista, recolhida por São Mateus no Evangelho de hoje, nos oferece preciosos elementos para isso.

Convertei-vos!

São João vivera os anos precedentes à sua missão pública nas paragens solitárias situadas mais ao norte do Jordão, onde também, mais tarde, Nosso Senhor passaria os quarenta dias de jejum, depois de ser batizado.[1] Agora, ele percorria toda a região do Jordão, pregando ao povo:

“Convertei-vos, porque o Reino dos Céus está próximo” (Mt 3,2)

No Batismo, todos recebemos uma semente do Reino de Deus, que devemos fazer crescer em nós pela prática da Religião, enquanto esperamos o momento de possuí-lo em plenitude, na eternidade. Todavia, no mundo moderno essa esperança da vida eterna é substituída por outra esperança, cujo objeto não é Deus: é a técnica, são as invenções e as descobertas científicas, que tornam a existência humana mais agradável e a prolongam de modo considerável. Chega-se até mesmo a admitir a ideia de que a ciência ainda fará surgir o elixir cujas propriedades tornarão imortais os homens.

Ora, a tecnologia e a medicina podem, na verdade, aumentar o número de nossos dias, mas não eternizá-los. Chegará a hora em que elas de nada adiantarão e deixaremos este mundo. Aí termina a esperança mundana, como ensina o Livro da Sabedoria: “É como poeira levada pelo vento, e como uma leve espuma espalhada pela tempestade; ela se dissipa como o fumo ao vento, e passa como a lembrança do hóspede de um dia” (5,14). Nesse sentido, a admoestação do Precursor é muito clara e atual para nós: trata-se de fazer penitência desses desvios, pois o Reino dos Céus não é dos que põem sua segurança no progresso, na máquina ou no conforto material, e sim daqueles que confiam em Deus e têm sua esperança posta na eternidade.

“João foi anunciado pelo profeta Isaías, que disse: “Esta é a voz daquele que grita no deserto: preparai o caminho do Senhor, endireitai suas veredas!”

Aplicada pelos quatro evangelistas à pessoa de São João Batista, esta passagem de Isaías possui um profundo simbolismo que nos lembra quão oportuna é para nós a mensagem do Precursor. Chama a atenção que o profeta localize a missão de João “no deserto”. Devemos interpretar esta menção num sentido mais metafórico que propriamente físico: João gritava e era ouvido por aqueles que estavam “no deserto”, ou seja, no inteiro desprendimento de tudo o que não conduz a Deus. Quando alguém, pelo contrário, está no bulício da “cidade”, aferrado ao que nela existe: a vaidade, as máquinas, o relacionamento humano que afasta da virtude etc., fica surdo à voz que o convida à conversão. À primeira vista, muitas dessas coisas podem parecer legítimas; no entanto, quem se apega ao que é lícito esquecendo- se de Deus, logo estará apegado também ao que é ilícito. Em nosso caso concreto, quantos afetos desordenados não estão impedindo que ouçamos o clamor de São João, dirigido a nós a todo instante, seja por moções interiores da graça em nossa alma, seja pela ação de outros?

Peçamos a Deus, que nos proporcione uma inteira fidelidade aos seus mandamentos, e uma plena lucidez sobre o que devemos nos desvencilhar, para que assim possamos receber com a alma limpa, o Divino Infante que nos aguarda de braços abertos.

Por Guilherme Motta