sexta-feira, 22 de dezembro de 2023

Paz: precioso dom do Natal

 

O beata nox! Sim, bendita noite que assiste ao nascimento de um Menino a inaugurar uma nova era histórica. Naquela noite foi oferecido à humanidade um precioso dom que não lhe seria retirado nem mesmo quando aquele Menino retornasse à eternidade: “Deixo-vos a paz, dou-vos a minha paz. Não vo-la dou como o mundo a dá. Não se perturbe o vosso coração, nem se atemorize!” (Jo 14, 27). […]

Todas as palavras de Jesus são de vida eterna e misteriosamente atraentes, mas, sendo recordadas bem junto ao Presépio, levam-nos a querer penetrar a fundo em seu significado, sobretudo as que se referem à paz trazida a nós naquela noite. Qual será sua natureza? É ela que toda criatura humana com sofreguidão deseja, mas com quanta frequência a busca onde ela não se encontra e, mais ainda, se equivoca quanto ao seu verdadeiro conteúdo e substância!

Não consistirá nesse equívoco a causa principal de o mundo estar quase sempre pervadido por guerras e catástrofes ao longo de vários milênios? Tudo fruto da pseudopaz que o mundo nos oferece, bem diferente da que os Anjos cantaram aos pastores, naquela bendita noite de Natal. […]

Bento XVI assim se exprimiu sobre o mesmo tema: “Em primeiro lugar, a paz deve ser construída nos corações. De fato, é neles que se desenvolvem sentimentos que podem alimentá-la ou, ao contrário, ameaçá-la, enfraquecê-la, sufocá-la. Aliás, o coração do homem é o lugar das intervenções de Deus. Portanto, ao lado da dimensão ‘horizontal’ das relações com os outros homens, revela-se de importância fundamental, nesta matéria, a dimensão ‘vertical’ da relação de cada um com Deus, no qual tudo tem o seu fundamento”.

Por isso, neste Natal, em meio aos múltiplos dramas atuais, ecoam mais do que nunca para nós os cânticos dos Anjos, como outrora para os pastores. Eles nos oferecem a verdadeira paz, a cada um de nós em particular, convidando-nos a subordinarmos nossas paixões à razão, e esta, à fé. Oferecem-nos também o término da luta civil, da luta de classes e das próprias guerras entre as nações, com a condição de observarmos com cuidado as exigências impostas pela hierarquia e pela justiça. Em síntese, é-nos indispensável, para recebermos dos Anjos essa oferta tão ansiada por nós, estarmos em ordem com Deus, reconhecendo n’Ele o nosso Legislador e Senhor, e amando-O com todo entusiasmo.

É o que, com tanta lógica e unção, comenta São Cirilo: “Não O olhes simplesmente como um Menino depositado num presépio, mas em nossa pobreza devemos vê-Lo rico como Deus, e por isso é glorificado inclusive pelos Anjos: ‘Glória a Deus nas alturas e paz na terra aos homens de boa vontade’. Pois os Anjos e todas as potências superiores conservam a ordem que lhes foi dispensada e estão em paz com Deus. De modo algum se opõem ao que Lhe agrada, mas estão firmemente estabelecidos na justiça e na santidade. Nós somos miseráveis ao colocar nossos próprios desejos em oposição à vontade do Senhor, e nos colocamos nas fileiras de seus inimigos. Isso foi abolido por Cristo, pois Ele mesmo é a nossa paz e nos une por sua mediação com Deus Pai, tirando o pecado, causa de nossa inimizade, justificando-nos pela fé e aproximando os que estão distantes”. […]

E com não menor espiritualidade, acrescenta São Jerônimo: “Glória no Céu, onde não há dissensão alguma, e paz na terra, onde há guerras diárias. ‘E paz na terra’. E essa paz em quem? Nos homens. […] ‘Paz aos homens de boa vontade’, isto é, àqueles que recebem Cristo recém-nascido”.

João Scognamiglio.

quarta-feira, 13 de dezembro de 2023

Os homens procuram a paz e não a encontram

 

Vós, Senhor Jesus, Deus humanado, sois entre os homens o Príncipe da Paz. Sem Vós a paz é uma mentira e, afinal, tudo se converte em guerra”.

Afinal, o que é a paz?

Quantas vezes ouvimos falar de paz durante este convulsionado ano prestes a findar-se! Entretanto, pouco temos ouvido da “glória a Deus no mais alto dos Céus”; e vemos cada dia menos homens “de boa vontade”, cheios de amor ao próximo, bem-dispostos em relação uns aos outros.

À vista disto, perguntamos: Por que os homens querem tanto a paz e não a encontram? O que é, concretamente, a paz?

Alguns a consideram uma situação de bem-estar sem enfermidades, adversidades, riscos; uma situação na qual se possa fazer em ininterruptos deleites todo o percurso da vida terrena. Para esses, a glória de Deus nada tem a ver com a paz na terra. São homens e mulheres plasmados pela mentalidade de que essa glória é algo totalmente insignificante.

Ora, não se pode dissociar da glória de Deus a paz na terra. Se os homens não derem a Deus a glória devida, a consequência evidente é que não haverá paz no mundo. Quando a adoração ao dinheiro, a divinização das massas, a desenfreada procura dos prazeres, o domínio despótico da força bruta, enfim, quando o paganismo em todos os seus aspectos vai invadindo a face da terra, a consequência é a falta de paz na qual vivemos. Buscamos a paz e não a encontramos, ela se recusa a habitar conosco.

Voltemos os olhos para o Menino Deus

À vista de tudo isso, acabamos sentindo em torno de nós um abismo entre o ideal e a realidade do que vivemos. Na nossa mente confrontam-se a justiça e a injustiça, o bem e o mal, a virtude e o pecado.

Aparentemente, hoje chegamos a conquistar o mundo inteiro. A ciência e a técnica nos pervadem, prestando numerosos serviços práticos. Máquinas e mais máquinas exercem funções que surpreendem. Contudo… não temos tranquilidade, a moralidade escasseia, a honradez tornou-se uma raridade e, sobretudo, falta-nos a fé.

Um velho psiquiatra comentava-me que até os enfermos, perdendo a religiosidade, não têm paz de alma. A inquietação corrói os corações de nossos contemporâneos. Esforçamo-nos em excogitar como obter uma correta disposição de todas as coisas da vida terrena e, para isso, nada melhor do que volver nossos pensamentos à noite de Natal.

Deixemos nossos ouvidos se extasiarem com este cântico, de todos conhecido e tantas vezes recitado: “Noite de paz, noite de amor, tudo dorme em derredor”. É o Stille Nacht, que nos eleva, cada ano, em sua manifestação de compaixão para com o Menino Deus recém-nascido, como a nos dizer: é tão pequeno este Deus infinito, é tão infinito este Deus pequeno. Quando a ouvimos ou cantamos, essa bela canção de Natal nos inspira movimentos interiores de ternura e de respeito.

Voltemos os olhos para o Divino Infante. Disse Plinio Corrêa de Oliveira, um grande católico do século passado: “Vós, Senhor Jesus, Deus humanado, sois entre os homens o Príncipe da Paz. Sem Vós a paz é uma mentira e, afinal, tudo se converte em guerra”. Nós O veremos nos presépios, durante o tempo de Natal, na augusta pobreza de uma gruta, junto da Virgem Maria, sua Santíssima Mãe, e de São José. Poderemos contemplá-Lo na debilidade de um bebê posto numa manjedoura, quão tosca e pobre!

Aí está quem nos convida a transformar o curso da História dos homens, a sair do impasse que nos enche de tristeza. Convidando-nos às vias da austeridade, do amor à cruz, da justiça ante todo tipo de iniquidades, de desapego dos prazeres ilícitos, à pureza de vida num mundo cheio de depravações.

A paz deve ser construída nos corações

Se a humanidade caminhasse no cumprimento da Lei de Deus, logo cessaria esta crise moral, esta crise de fé, esta crise religiosa. A responsabilidade está em nós mesmos. Que se produza em cada um de nós uma metanóia, uma mudança de mentalidade. Sem isso, resultará vão tudo quanto se intente.

E quando nos inclinarmos diante do presépio, olhando com encanto as pequenas imagens da Sagrada Família, e sentirmos como Deus quis pôr-Se a nosso alcance, peçamos com confiança por nossa reforma pessoal e pela do próximo. Então, sim, estaremos certos de que haverá solução para a crise contemporânea.

“Em primeiro lugar” – afirmou Bento XVI –, “a paz deve ser construída nos corações. De fato, é neles que se desenvolvem sentimentos que podem alimentá-la ou, ao contrário, ameaçá-la, enfraquecê-la, sufocá-la”. E acrescentou sabiamente: “Aliás, o coração do homem é o lugar das intervenções de Deus”.

Na Santa Missa, os fiéis rezam em coro ao aproximar-se o momento da Comunhão: “Cordeiro de Deus, que tirais o pecado do mundo, dai-nos a paz”. Que o Menino Jesus, a Virgem Maria e São José derramem sobre todos nós suas bênçãos, encham nossos corações das santas e puras alegrias do Natal, dando-nos a paz verdadeira: a paz de Cristo.

 Por Pe. Fernando Néstor Gioia Otero, EP.