Joseph Ratzinger foi, disso não há dúvidas, um dos grandes teólogos
do nosso tempo e uma das mentes mais brilhantes da história da Igreja.
Papa, teólogo, intelectual, bom pastor, foi, gosto de pensar, alguém que
conseguiu unir harmoniosa e paradoxalmente ortodoxia e vanguarda. Eu o
vi de perto algumas abençoadas vezes e me emociono ao lembrar. Seu
carisma não era vulgar, marcado pelo sentimentalismo, e, sim, da
autoridade de seu saber e do seu zelo pela sã doutrina. Sua morte me
deixou bastante comovido e em oração confiante. Firmeza não significa
agressividade, nem convicção inabalável quer dizer verborragia belicosa.
A humildade de Bento XVI, um dos maiores intelectuais da Igreja de
todos os tempos, é um exemplo para todos nós, algo a ser refletido e
imitado.
Certa vez, um amigo sacerdote e que trabalhava em Roma foi a Munique para uma atividade religiosa quando, coincidentemente, o então Cardeal Joseph Ratzinger, Prefeito da Congregação para a Doutrina e Fé, visitou sua terra natal para resolver problemas da Igreja na Alemanha. Numa entrevista coletiva para a imprensa alemã e de outros países, um repórter fez uma longa introdução à sua pergunta, capciosa, venenosa, falando muito mal da Igreja. Disse que a Igreja agonizava na Alemanha, que os fiéis já não eram tão fiéis assim, que havia escândalos, e mais uma porção de afirmações infundadas ou pouco verídicas. Todos esperavam que o Cardeal fosse responder algo duro. Ratzinger, com olhar paradoxalmente firme e doce, voz calma, serena e elegante, própria de quem fala com autêntica autoridade, agradeceu a pergunta e se limitou a responder “mas é exatamente para ajudar a resolver esses problemas que estou aqui”. Simples, direto, o Cardeal desarmou o jornalista e o calou de forma absolutamente cristã. Com sabedoria, impediu o alongamento da maldade em curso e a discussão estéril, improdutiva. Espero sempre me lembrar desse gesto de caridade do eterno Papa e, com isso, ser a cada dia um homem melhor.
Sua postura sempre foi a de quem tem conteúdo
cultural e muita oração, de quem vive com o livro na mão e o joelho no
chão. A sabedoria exige esforço contínuo e um coração aberto à Verdade,
como foi, é e será eternamente o do magno Cardeal, o querido Papa
Emérito Bento XVI. Sacerdote, autoridade eclesial, teólogo, Papa, um
homem justo, quem sabe… santo! Nunca me esquecerei de seu pontificado.
Sou-lhe profundamente grato. Em um tempo de liquefação de valores, de
esvaziamento cultural, de incensamento da emotividade excessiva, de
vulgarização da fé e da razão, de desprezo por protocolos e tradições,
ele foi a doce contradição, aquele que dava esperança de ser possível
não se deixar arrastar pelos gostos muito duvidosos do mundo.
Grande
estudioso da fé, homem justo, cooperador da Verdade, defensor da
ortodoxia e um fiel trabalhador da vinha do Senhor. Sua envergadura
intelectual era (e é) tanta, que certa vez ouvi de um professor de
teologia, simpatizante de corrente doutrinária não exatamente admiradora
do Papa Emérito, que o “problema de Bento XVI é que ele escreve bem
demais, inegavelmente profundo”. Evidentemente que coloco muito entre
aspas a palavra “problema” e ressalto com entusiasmo a afirmação
“inegavelmente profundo”. Ele foi e sempre será o Papa da minha vida.
Reverenciar
a memória do Papa Emérito é abraçar a catolicidade e se sentir seguro
de pertencer à Igreja que o Senhor fundou e que sempre presenteou com
pastores zelosos, dedicados, enamorados da Verdade e, não poucos, com
reluzente brilho intelectual. Descanse em paz, Sumo Pontífice. Seu nome
para sempre será anelado ao da Eterna Roma. Que Nosso Senhor o receba de
braços abertos na Jerusalém Celeste e lhe dê o descanso eterno e a luz
que não se apaga.
Paulo Henrique Cremoneze
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