A verdadeira piedade deve impregnar toda a alma humana, e, portanto, também deve despertar e estimular a emoção. Mas a piedade não é só emoção, e nem mesmo é principalmente emoção. A piedade brota da inteligência, seriamente formada por um estudo catequético cuidadoso, por um conhecimento exato de nossa Fé, e, portanto, das verdades que devem reger nossa vida interior.
A piedade reside ainda na vontade. Devemos querer seriamente o bem que conhecemos. Não nos basta, por exemplo, saber que Deus é perfeito. Precisamos amar a perfeição de Deus, e, portanto, devemos desejar para nós algo dessa perfeição: é o anseio para a santidade.
Sem esta disposição, todo o “querer” não
é senão ilusão e mentira. Podemos ter a maior ternura na contemplação
das verdades e mistérios da Religião: se daí não tirarmos resoluções
sérias, eficazes, de nada valerá nossa piedade.
É o que se deve dizer especialmente nos dias da Paixão de Nosso Senhor.
Não nos adianta apenas o acompanhar com ternura os vários episódios da Paixão: isto seria excelente, não porém suficiente. Devemos dar a Nosso Senhor, nestes dias, provas sinceras de nossa devoção e amor. Estas provas, nós as damos pelo propósito de emendar nossa vida, e de lutar com todas as forças pela Santa Igreja Católica.
A Igreja é o Corpo Místico de Cristo. Quando Nosso Senhor interpelou São Paulo, no caminho de Damasco, perguntou-lhe: “Saulo, Saulo, por que me persegues?”. Saulo perseguia a Igreja. Nosso Senhor lhe dizia que era a Ele mesmo que Saulo perseguia.
Se perseguir a Igreja é perseguir a Jesus Cristo, e se hoje também a Igreja é perseguida, hoje Cristo é perseguido. A Paixão de Cristo se repete de algum modo também em nossos dias.
Como se persegue a Igreja? Atentando contra os seus direitos ou trabalhando para dEla afastar as almas.
Todo o ato pelo qual se afasta da Igreja uma alma é um ato de perseguição a Cristo. Toda a alma é, na Igreja, um membro vivo. Arrancar uma alma à Igreja é arrancar um membro ao Corpo Místico de Cristo.
Se queremos, pois, apiedar-nos com a Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo, meditemos sobre o que Ele sofreu na mão dos judeus, mas não nos esqueçamos de tudo quanto ainda hoje se faz para ferir o Divino Coração.
A Igreja, sofredora, perseguida, vilipendiada, aí está a nossos olhos indiferentes ou cruéis. Ela está diante de nós como Cristo diante de Verônica. Condoamo-nos com os padecimentos dela. Com nosso carinho, consolemos a Santa Igreja de tudo quanto Ela sofre. Podemos estar certos de que, com isto, estaremos dando ao próprio Cristo uma consolação idêntica à que Lhe deu Verônica.
E nós? Importamo-nos com isto? Sofremos com isto? Rezamos por que estas almas se convertam? Fazemos penitências? Fazemos apostolado? Onde nosso conselho? Onde nossa argumentação? Onde nossa caridade? Onde nossa altiva e enérgica defesa das verdades que eles negam ou injuriam?
O Sagrado Coração sangra com isto. Sangra pela apostasia deles, e por nossa indiferença. Indiferença duplamente censurável porque é indiferença para com nosso próximo e sobretudo indiferença para com Deus.
Será bem exato que, para conservar a Fé, evitamos tudo que a pode por em risco? Evitamos as leituras que a podem ofender? Evitamos as companhias nas quais ela está exposta a risco? Procuramos os ambientes nos quais a Fé floresce e cria raízes? Ou, em troca de prazeres mundanos e passageiros, vivemos em ambientes em que a Fé murcha e ameaça cair em ruínas?
Todo o homem, pelo próprio fato do instinto de sociabilidade, tende a aceitar as opiniões dos outros. Em geral, hoje em dia, as opiniões dominantes são anticristãs.
Pensa-se contrariamente à Igreja em matéria de filosofia, de sociologia, de história, de ciências positivas, de arte, de tudo enfim. Os nossos amigos, seguem a corrente. Temos nós a coragem de discordar?
Ou contentamo-nos negligentemente em ir vivendo, aceitando tudo quanto o espírito do século nos inculca, e simplesmente porque ele no-lo inculca?
Quando o Divino Mestre gemeu, chorou, suou sangue durante a Paixão não O atormentavam apenas as dores físicas, nem sequer os sofrimentos ocasionados pelo ódio dos que no momento O perseguiam.
Atormentava-O ainda tudo quanto contra Ele e a Igreja faríamos nos séculos vindouros. Ele chorou pelo ódio de todos os maus, de todos os Arios, Nestórios, Luteros, mas chorou também porque via diante de si o cortejo interminável das almas tíbias, das almas indiferentes, que sem O perseguir não O amavam como deviam.
É a falange incontável dos que passaram a vida sem ódio e sem amor, os quais, segundo Dante, ficavam de fora do inferno porque nem no inferno havia para eles lugar adequado.
Eis a grande pergunta a que, com a graça de Deus, devemos dar resposta nos dias de recolhimento, de piedade e de expiação em que devemos entrar agora.
Texto extraído, com adaptações de "O Legionário" de Plínio Corrêa de Oliveira
Nenhum comentário:
Postar um comentário