O Tríduo Sagrado da Páscoa
Jesus morto, sepultado e ressuscitado
Um olhar de conjunto
“Ó abismo da riqueza, da
sabedoria e da ciência de Deus! Como são insondáveis seus juízos e
impenetráveis seus caminhos!... Porque tudo é dele, por ele e para ele. A ele a
glória pelos séculos! Amém” (Rm 11, 33.36).
A expressão acima resume a
aliança que vai além da infidelidade do povo de Israel. Do evento do Mistério
Pascal emana a vida divina e perene da Igreja.
Na tarde da quinta feira Santa
tem início o Tríduo Pascal, com a celebração da Ceia do Senhor, cujo término ocorre
com as vésperas do dia Páscoa. A luz pascal constitui a interface que ilumina a
história da Salvação. É um farol que orienta tanto a compreensão e sentido do
Antigo Testamento (AT) quanto ao mistério da vida de Jesus (NT), desde a
encarnação, paixão, morte e ressurreição, até os fins dos tempos.
A Quinta Feira Santa
A Missa do Crisma, presidida pela manhã pelo bispo em sua catedral,
com a participação do clero e do povo, encerra a quaresma e prepara os Óleos
santos finalizados à celebração da iniciação cristã - especialmente durante a
grande vigília pascal - e a da unção dos enfermos.
A Ceia do Senhor, ao anoitecer, abre o Tríduo celebrando na forma sacramental da Eucaristia o dom do Corpo e
Sangue do Senhor. A humildade com que Jesus, o Mestre, lava os pés dos
discípulos, instaura novo modelo nas relações recíprocas entre os discípulos e
entre toda e qualquer pessoa em toda situação e tempo.
A Sexta Feira Santa: celebração da Paixão do Senhor
No centro da celebração está o
evento e o mistério da cruz, proclamado nas Escrituras (Is 52,13-53,12; Jo
18,1-19,42), honrado com a adoração e o beijo da cruz por parte da a
assembléia, reconhecido como intercessão permanente junto do Pai (Oração
universal), interiorizado na comunhão. A cruz é tragédia em nível humano, porém
a fé a proclama como revelação suprema do amor de Jesus e início da vida nova
que dele brota.
Neste dia predomina a
contemplação silenciosa e adorante do evento da crucifixão. A cruz é “o eixo do
mundo”, diziam os padres da Igreja, pois nela se manifesta o extremo
compromisso de Deus em favor do mundo. Porém este silêncio se torna o grito
mais alto que testemunha seu amor sem limite.
O grito sofrido e confiante de
Jesus, “Meu Deus, meu Deus, por que me
abandonaste?” (Mc 15,34; Sal 21, 2), assume em si mesmo o grito dos
crucificados de todos os tempos, e abre para eles a esperança, pois “por isso
Deus o exaltou e lhe concedeu um título (Kyrios- Senhor) que é superior a todo
título”, e o fez raiz e modelo de vida nova entre os irmãos (Fil 2, 6-9).
Sábado Santo: dia do silêncio de Deus e dos homens
O Sábado Santo é o dia do
grande silêncio. Só a Liturgia das Horas acompanha as etapas do dia.
“Que está acontecendo hoje?”, se pergunta o autor de uma antiga homilia sobre
o sábado santo (séc. IV). “Um grande
silêncio reina sobre a terra. Um grande silêncio e uma grande solidão. Um
grande silêncio, porque o rei está dormindo; a terra estremeceu e ficou
silenciosa, porque o Deus feito homem adormeceu e acordou os que dormiam há
séculos.” (LH, IV, Sábado santo).
O Sábado Santo testemunha que
Deus continua descendo até as entranhas mais obscuras e ambíguas da alma
humana, e nas experiências mais marginalizadas, para recuperá-las e trazê-las à
vida. Nada e ninguém é abandonado a si mesmo. Aprender a conviver com a
“fraqueza” de Deus, com os silêncios de Deus, com os tempos e os diferentes
ritmos de Deus, dos seus projetos, com a pedagogia com a qual ele nos dirige e
acompanha com amor fiel embora às vezes incompreensível. Eis a lição do Sábado Santo. O Sábado Santo não é somente o segundo dia do tríduo: é uma dimensão
constitutiva da identidade cristã e de todo caminho espiritual cristão.
Para perceber e acolher a voz
silenciosa que sobe da escuridão, é preciso o silêncio interior que abre à
escuta e à uma visão mais aguda.
Baseado em texto de Dom Emanuele Bargellini
Prior do Mosteiro da
Transfiguração, Mogi das Cruzes – SP
Doutor em liturgia pelo
Pontificio Ateneo – Santo Anselmo – Roma
Nenhum comentário:
Postar um comentário