
Após ter sido batizado por São João
Batista, Nosso Senhor foi conduzido pelo Espírito Santo ao deserto,
situado entre o Rio Jordão e a cidade de Jericó, a fim de ser tentado
pelo demônio.
Três tentações
Lá chegando, Jesus se pôs em oração e
fez um jejum total, ficando durante 40 dias e 40 noites sem comer nem
beber. No final desse período, o demônio apareceu e Lhe disse:
“Se és
Filho de Deus, manda que estas pedras se transformem em pães! Mas Jesus
respondeu: ‘Está escrito: Não só de pão vive o homem, mas de toda
palavra que sai da boca de Deus'” (Mt 4, 3-4).
Então, o demônio levou-O a Jerusalém, colocou-O no pináculo do Templo e afirmou:
“Se és
Filho de Deus, lança-Te daqui abaixo! Porque está escrito: ‘Deus dará
ordens aos seus Anjos a teu respeito, eles Te levarão nas mãos, para que
não tropeces em alguma pedra’. Jesus lhe respondeu: ‘Também está
escrito: Não tentarás o Senhor teu Deus!'” (Mt 4, 6-7).
Por fim, o diabo conduziu Jesus ao topo de um monte muito alto, mostrou-Lhe todos os reinos do mundo e sua glória, e declarou:
"Eu Te darei tudo isso, se Te
ajoelhares diante de mim, para me adorar.’ Jesus lhe disse: ‘Vai-te
embora, satanás, porque está escrito: Adorarás ao Senhor teu Deus e
somente a Ele prestarás culto’. Então o diabo O deixou. E os Anjos se
aproximaram e serviram a Jesus” (Mt 4, 9-11).
Afirma São Tomás de Aquino que Cristo
retirou-Se para o deserto, “como a um campo de batalha, com o fim de ser
ali tentado pelo diabo”.
Esse acontecimento foi prefigurado por
Moisés, que ficou em total jejum por 40 dias e 40 noites, antes de
receber de Deus as tábuas da Lei (cf. Ex 34, 28). E também pelo Profeta
Elias, o qual caminhou pelo deserto durante o mesmo período até chegar
ao Monte Sinai (cf. I Rs 19, 8).
Contraste entre Adão e Jesus Cristo
Ao contrário de Nosso Senhor Jesus
Cristo, que rechaçou o demônio, Adão cedeu ao maligno quando cometeu o
pecado original. Ele perdeu aquilo que o demônio prometera: “sereis como
Deus” (Gn 3, 5).
“Pois com o pecado a vida divina se
extinguiu em sua alma, enquanto se tivesse correspondido ao mandado do
Senhor receberia um acréscimo de felicidade, manteria o estado de graça e
teria feito notável progresso na vida espiritual. Portanto, aquilo que o
tentador fingia querer dar foi justamente o que lhe roubou.
“A Nosso Senhor ele ofereceu o serviço
dos Anjos e todos os tesouros da Terra, coisas que era incapaz de
conceder, mas que foram entregues a Jesus-Homem junto com a realeza
sobre toda a humanidade e sobre a ordem da criação, por ter vencido
satanás e ter abraçado os tormentos do Calvário.
“Eis um princípio que deve nortear
constantemente a nossa vida, até a hora da morte: nunca podemos dialogar
com o demônio, criatura maldita que sempre tira aquilo que promete.
Devemos encerrar qualquer conversa com ele logo no início, com o apoio
da Palavra de Deus, à imitação de Nosso Senhor Jesus Cristo.”
Comenta o grande exegeta Fillion: “Adão,
vencido pela serpente e expulso do Paraíso terrestre, tinha visto os
Anjos fecharem a porta de entrada dele. O Filho do homem vitorioso vê o
deserto se transformar em Éden, e os espíritos bem-aventurados se
aproximarem d’Ele para servi-Lo.”
A tentação é um benefício
O que vem a ser a tentação? “Chama-se propriamente tentação tudo aquilo que instiga o homem ao pecado.”
Deus permite que o demônio nos tente, “com vistas ao nosso benefício,
para nos dar oportunidade de adquirir força, experiência e sagacidade na
luta contra ele, e, derrotado este, outorgar-nos o prêmio de não ter
cedido […]
“As tentações nos obtêm, sobretudo,
méritos para a eternidade. Tanto o santo quanto o pecador são tentados, e
às vezes o primeiro mais que o segundo, a julgar pelo modo atroz com
que satanás investiu contra Nosso Senhor.
“A grande diferença entre ambos é que um
recusa as solicitações e o outro se rende. Logo, ser tentado não é um
desastre, pelo contrário, pode ser até um bom sinal.
“De nossa parte é preciso não consentir
e, para isso, apoiemo-nos no auxílio divino, pois seria uma insensatez
concebermos nossas qualidades como o fator essencial na luta contra o
demônio, o mundo e a carne.”
Quando uma pessoa em estado de graça
cede à tentação e comete um pecado mortal, ela expulsa Deus de sua alma e
se joga nas garras do demônio; se não se arrepender e continuar nessa
via, ela pode chegar até mesmo a adorar o príncipe das trevas.
Eis o que ensina São João Bosco:
“Se alguém quiser dar-nos o mundo
inteiro para levar-nos a adorar satanás, isto é, a cometer um só pecado,
recusemos com horror qualquer oferecimento.”
Peçamos a Nossa Senhor, terror dos
demônios, que nos proteja continuamente contra as insídias do maligno,
compenetrados de que é preferível morrer a cometer um pecado grave.
Por Paulo Francisco Martos