sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

Foi cegado para ser mudado



“Paulo foi derrubado para ser cegado;
foi cegado para ser mudado;
foi mudado para ser enviado;
foi enviado para que a verdade aparecesse”
(Santo Agostinho)
  
Saulo era o seu nome até o momento de sua conversão ao cristianismo. Sendo filho de pai judeu, Paulo recebeu rigorosa formação religiosa, tornando-se desde a mocidade num ferrenho fariseu (At 26,5) perseguidor dos cristãos, que “devastava a Igreja: entrando pelas casas, arrancava homens e mulheres e metia-os na prisão” (At 8,3). Ainda como jovem, Paulo presenciou e aprovou o apedrejamento de Santo Estevão (At 8, 1).

Como entender, então, a conversão de um homem de coração tão duro, tão cheio de culpa e tão grande perseguidor dos cristãos e contestador da fé em Cristo? Mistério insondável da misericórdia e amor de Deus que em não poucas vezes converteu pecadores, transformando-os em arautos do Evangelho e exemplos de santidade. Deus é verdadeiramente surpreendente e, de fato, como lemos na Bíblia, seus pensamentos e caminhos não são nem os nossos nem como os nossos. Saulo, o bárbaro perseguidor da Igreja, se transformou em Paulo, o “Apóstolo” por excelência, o maior pregador do Evangelho aos pagãos, o chamado “doutor das nações”, que, juntamente com Pedro, compõe as duas principais colunas da Igreja Católica.

É o próprio Paulo quem explica, na doutrina que expõe em suas Epístolas, que sua conversão se deu pelo poder da graça de Deus, somente ela capaz de operar o milagre nele manifestado e outros iguais ou maiores do que este.
Conforme se pode ler especialmente em At 22, 3-16, a conversão de Paulo foi realmente milagrosa:
- porque Jesus mesmo foi quem a fez: “Saulo, Saulo, por que me persegues?... Eu sou Jesus, o Nazareno, a quem persegues... Levanta-te. Vai a Damasco. Lá te será dito tudo o que te importa fazer”.
- pela maneira como se deu a conversão: Enquanto estava a caminho de Damasco, ao meio dia, uma grande luz vinda do céu envolveu Paulo tão fortemente que o derrubou do cavalo, deixando-o cego.
- pelo comportamento do próprio convertido: 
Paulo, tendo caído por terra e ouvido aquela voz de Cristo, só pôde exclamar: “Quem és Tu, senhor?... Que devo fazer, Senhor?” Deixar-se seduzir pelo Senhor é também uma graça, da qual Paulo foi acolhedor.

Como se lê no profeta: “Seduziste-me, Senhor, e eu me deixei seduzir por ti; tu te tornaste forte demais para mim, tu me dominaste” (Jr 20, 7). A conversão é sempre uma comunicação primeira de Deus, uma iniciativa do Senhor que não depende de nossos esforços, nem podemos retê-la por mais tempo. É puro dom de Deus, que dá quando e como quer. É claro que é possível rejeitá-la e dizer não, pois Deus respeita a nossa liberdade. Eis o que diz o Espírito de Deus: “Quanto a mim, repreendo e educo todos os que amo. Recobra, pois, o fervor e converte-te! Eis que estou à porta e bato: se alguém ouvir minha voz e abrir a porta, entrarei em sua casa e cearei com ele, e ele comigo” (Ap 3, 18-20). Abrir a porta é a iniciativa que cabe a nós tomar, na liberdade, como uma resposta consciente e pessoal.

Essa experiência forte de Deus definiu a vida de tantos santos e santas. Basta lembrar a conversão de Santo Agostinho, depois de um processo duro e longo de lutas interiores e reflexões intelectuais. Até que um dia pode exclamar: “Tarde te amei! Beleza tão nova e tão antiga! Estavas comigo e eu não estava contigo. Chamaste, gritaste, feriste a minha surdez. Brilhaste com fulgores, varreste minha cegueira, exalaste teu perfume, e eu respirei e fui a teu encalço. Saboreei-te: tenho fome e sede. Tocaste-me: inflamei-me pela paz que me deste. Minha vida se encherá de ti, ó Vida!” (Confissões de Santo Agostinho).

Como não se lembrar também da conversão de São Francisco operada pelo Senhor quando da experiência do abraço ao leproso e da escuta da voz do Crucificado, na Capela de São Damião, que lhe disse: “Francisco, restaura a minha Igreja, que como vês está em ruínas”. Em seu Testamento, Francisco confessou que foi a partir dessa experiência do encontro com Cristo e o pobre que a sua vida mudou: “Desde então tudo o que antes era para mim amargo tornou-se doce e, não demorou muito, eu deixei as seduções do mundo para somente seguir os passos de Nosso Senhor Jesus Cristo”.

Não terá sido diferente para nós a experiência da conversão, da comunicação de Deus em nossa vida, na nossa história pessoal. O Senhor está sempre muito perto de nós, à nossa porta e quer entrar. Importa, como nos diz o profeta Isaías: “buscar o Senhor, enquanto se deixa encontrar; invocá-lo enquanto está perto” (Is 55, 6). Se assim agirmos, então, tudo pode acontecer de novo, e tudo se renovar: “Se alguém me ama e guarda minha palavra, o Pai o amará e viremos e nele faremos morada (a Trindade Santa)” (Jo 14, 23).
São Paulo se transformou em exemplo vivo, para as horas difíceis e decisivas de nossa existência. Comemoramos pois, hoje, com solenidade, a sua conversão. Ele próprio confessa, por diversas vezes, que foi perseguidor implacável das primeiras comunidades cristãs. Por causa disso atribuiu a si mesmo o título de "o menor entre os Apóstolos" e, ainda, de "indigno de ser chamado Apóstolo". A visão de Estevão apontando para os céus abertos e Filho do Homem, o Cristo, aí reinando, domina a vida toda do Apóstolo dos gentios, Paulo de Tarso.

Além das grandes e contínuas viagens apostólicas e das prisões e sofrimentos por que passou, devemos a este Santo, que se auto denomina "servo de Cristo", a revelação da mensagem do Salvador, ou seja, as 14 Epístolas ou Cartas. Elas formam como que a Teologia do Novo Testamento, exposta por um Apóstolo. Jamais apareceu outro homem sobre a terra que fundamentasse tão bem a nossa fé em Cristo, presente na História, como também, presente em nossa própria existência. Foi São Paulo quem o fez de maneira insuperável.

Toda pessoa é orientada pela Providência de Deus. Mas, também, toda cidade recebe um destino e uma missão que deve cumprir, com o auxílio da graça e com a intercessão dos santos. Na contemplação dos heróis do cristianismo, os Santos, comemoramos hoje solenemente àquele que deu o nome à maior metrópole da América Latina. Parabéns a cidade de São Paulo.
São Paulo de Tarso, apóstolo dos gentios, Doutor das nações, rogai por nós! 
Fábio Christiano

Oração ao Apóstolo São Paulo

Ó São Paulo, Patrono de nossa Arquidiocese, discípulo e missionário de Jesus Cristo: ensina-nos a acolher a Palavra de Deus e abre nossos olhos à verdade do Evangelho. Conduze-nos ao encontro com Jesus, contagia-nos com a fé que te animou e infunde em nós coragem e ardor missionário, para testemunharmos a todos que Deus habita esta Cidade imensa e tem amor pelo seu povo! Intercede por nós e pela Igreja de São Paulo, ó santo apóstolo de Jesus Cristo! Amém.

sábado, 19 de janeiro de 2013

Manifestação para todos



Você lerá a seguir, uma síntese da reportagem de Anita Sanchez Bourdin relatando a manifestação que aconteceu na França fazendo frente à aprovação do casamento entre homossexuais, saindo em defesa dos direitos das crianças a terem um pai e uma mãe - referenciais de um crescimento psicossociológico sadio. 
Como isso nos alenta e estimula!



Domingo passado, dia 13 de janeiro de 2013, em Paris, no Champ de Mars, aconteceu a Manif Pour Tous. 

Foi uma iniciativa francesa que reuniu aproximadamente 1 milhão de pessoas que se reuniram para protestar contra o projeto do governo de François Hollande, "que quer abrir o casamento aos casais do mesmo sexo, como afirma o título oficial do texto", discutido pela Comissão das Leis da Assembléia Nacional Francesa.








O motivo que levou tantas pessoas a saírem de casa sob o frio e a chuva é a indignação dos franceses, inclusive de alguns grupos homossexuais, da tentativa de se instaurar uma nova ordem que impeça as crianças de terem um pai e uma mãe. Havia uma participação expressiva dos Poissones Roses (Peixes Rosa), e da associação Mais Gays sem Casamento, de Xavier Bongibault, além de muitos representantes de diferentes religiões, cristãos, judeus, muçulmanos, prontos para protestar principalmente contra a adoção de crianças por casais homossexuais.



A multidão ouviu com atenção a leitura da carta ao presidente François Hollande.

Quando centenas de milhares de pessoas cantaram "Hollande, a tua lei não é bem-vinda", com respeito, mas com determinação, é porque algo importante está acontecendo. As 
convicções pessoais estão alçando a voz. 



Nenhum slogan de partido foi destacado; foi apenas o anúncio de uma humanidade comum, unida na diversidade: homens, mulheres, crentes, não-crentes, jovens e idosos, pessoas em cadeira de rodas ou à pé, famílias, solteiros, funcionários, cidadãos. Todos mostrando juntos que a "diversidade" não é fácil, mas é uma realidade fértil e educativa.


Quem marchou não vai baixar a guarda. Esses também conhecem os números. Temos pontos de referência, da JMJ de agosto de 1997, que reuniu 1.200.000 jovens na França, com a presença do Papa, agora Beato, João Paulo II. 



Uma bandeira que surgiu desfilando na Place d'Iena, sob a estátua equestre de George Washington, trazia escrito em letras garrafais: "Matrimoniófilo, e não homofóbico". Outra que passou pelo Champ de Mars: "Não destruam as referências": "Papai + Mamãe", a referência para toda criança. É o que o presidente da Mais Gays Sem Casamento repetia: "Eu tenho sorte de ter um pai e uma mãe".






Todo mundo diz, em suma, tanto em Paris quanto em Roma ou em qualquer outro lugar, que aqueles valores em que a sociedade se baseia “não são negociáveis”.
O site da Manif, hoje, diz simplesmente: "Éramos um milhão! Obrigado!".

segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

A fé "Mariana"




Na hora em que Adão se apresentou a Deus e falou:
"Fiquei com medo de ti porque estava nu" - nessa hora é que vieram à luz o ateísmo e a descrença.
Ateísmo e descrença que, em geral, não passam de medo de Deus, pavor de olhar no rosto dele, terror de escutar sua Palavra, desgosto de aturar suas exigências... Melhor fazer de conta que Deus não existe...

Na hora em que Maria falou a Deus: "Senhor, eis-me aqui" - nessa hora é que se deu o nascimento da verdadeira fé. Fé sem restrições, que logo se transforma em amor, dedicação e serviço.
Fugir de Deus, esconder-se dele, buscar uma toca onde ele não possa descobrir-nos, recusar seus planos e dizer um redondo NÃO: nisto consiste hoje a nossa desgraça.

Maria derrubou a parede do ateísmo, interrompeu a longa série dos "nãos", saiu à luz do sol e abriu o coração para acolher a Palavra da vida. E foi assim que Deus achou uma brecha para entrar em nosso mundo.

É naquele "sim" dado aos planos de Deus que nascem a importância, a grandeza e a glória de Maria.
Nós, porém, ao longo dos séculos, enfeitamos Maria que nem árvore de Natal. Carregamo-la de adornos incríveis, dedicamos-lhe basílicas e santuários de grande beleza, exaltamos sua humildade, sua virgindade, sua maternidade divina...

Nada contra, é claro. Mas é que poucas vezes nos lembramos de exaltar o momento decisivo da vida dela: o momento daquele "sim" que mudou a história humana. Foi aí que ela teve a coragem de confrontar com o Deus "terrível" - e descobriu que Deus não passa de um Pai...

Maria, hoje, é para nós Mestra da fé. Fé de primeira qualidade, fé "mariana", que consiste em crer sem ver, obedecer sem entender, assumir sem temer. Só uma fé assim é que poderia transformar nossas pessoas em presenças vivas de Cristo na Terra...

                                                                                          Pe. Virgílio, ssp

segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

O que seria de nós sem a vida consagrada?



Esta pergunta nos é dirigida por Monsenhor Juan Del Rio Martín, Arcebispo Castrense da Espanha, em um artigo publicado por Zenit, por ocasião da Jornada Mundial da Vida Consagrada, e traduzido por Thácio Siqueira.

Nele, Monsenhor Juan afirma que o secularismo penetrou diversos setores da vida cristã, e que este é um mal que mundaniza a Igreja e a torna ineficaz para evangelizar o mundo.
Ele afirma que por outro lado, o mundo vive uma cristofobia, o anticatólico, que rejeita o direito da Igreja de viver em liberdade.
Este “vírus” que contaminou tanto a Igreja como as famílias, manifesta-se pela secularização de sacerdotes, da vida comunitária de congregações e ordens religiosas, nas  rupturas matrimoniais e na queda da natalidade.

Contudo, ater-se aos diagnósticos não leva a lugar nenhum, afirma Mons. Juan. O Papa Bento XVI exorta-nos constantemente a recuperar a Deus como centro da nossa vida cristã, e ser humildes para que possamos perguntar: o que o Senhor me pede, a mim e à sua Igreja, nestes momentos tão complexos e turbulentos que estamos vivendo? 

A vida religiosa em todas as suas formas está intimamente relacionada com a Palavra de Deus, atrás de uma freira, padre, religioso, religiosa, consagrado há um ditado ou ação de Jesus, que cativou esse fundador e deu como consequência o nascimento de uma nova família de consagrados em prol da edificação da Igreja e de sua missão evangelizadora no mundo. As duas formas de Vida Consagrada, contemplativa e ativa, são os dois pulmões da comunidade eclesial. Sua presença entre os homens representa a geografia da oração, do apostolado, da caridade. Tudo isso vivido de acordo com os conselhos evangélicos na fraternidade cristã, sujeito. 

A Igreja não pode ignorar este grande tesouro de fidelidade a Deus e de serviço aos mais necessitados. O povo cristão atual tem que despertar do seu sono e deve ter mais consciência de cooperação no ressurgimento vocacional para estender o Reino de Deus e a sua justiça (cf. Mt 6,33). 

Segundo Mons. Juan, entrar hoje na "religião” , como se dizia antigamente, é remar contra a maré. É para pessoas muito focadas no essencial da fé, que não desejam se submeter ao pensamento único, que não se conformam com o hedonismo agradável dominante, que têm muito claro que os pobres não são artigos de modas ideológicas, que descobriram a Igreja como o maior espaço para a liberdade pessoal e comunitária, que se apaixonaram pela forma de viver o Evangelho de um fundador. 

Ser religioso ou religiosa é optar por uma forma de vida que não está em voga, que não tem aplausos, que não tem garantias. No entanto, é a forma mais bonita de viver a vida "escondida em Cristo" (Cl 3,3), de ser "sal e luz do mundo" (Mt 5,13-16), de encarnar o espírito das bem-aventuranças. Temos de eliminar essa idéia de que os padres, monges e freiras são "espécies em perigo de extinção". Deus não abandona a sua Igreja, e quando parecem esgotadas as águas do poço eclesial da Europa, surgem abundantes vocações nos outros continentes. Quando um carisma se apaga, brotam outras formas de vida consagrada. Mesmo entre nós, apesar do problema demográfico no Ocidente e da crise de fé, há alguns jovens que com a graça de Deus rompem com os padrões estabelecidos e entram numa ordem, congregação ou instituto secular. Ainda temos mães e pais cristãos que se alegram quando um filho ou filha vão para um convento ou para as missões. 

Não está tão seco o poço das nossas comunidades cristãs! Podemos estar tão obcecados com o número e a substituição nos vários serviços e não agradecer ao Senhor por este grande testemunho de fidelidade que hoje representam tantos religiosos que morrem sem ter “olhado para trás" (Lc 9,62). Aí temos o grande exemplo de humildade e de humilhação que nestes momentos significa aceitar a realidade dolorosa de fechar casas e reestruturar as províncias. 

Deus também está falando neste empobrecimento institucional! E, finalmente, o testemunho do serviço aos pobres, anciãos, doentes, crianças e jovens, quando o outono da existência aparece, eles e elas estão ali até que chegue a “irmã morte”, que em não poucos casos tem o nome de martírio. 

Em suma, são novos tempos com grandes desafios. Não temos fórmulas mágicas, não devemos cair em pessimismos contagiosos, nem cair em ilusões triunfalistas. Só a fé em Deus nos faz ver que ainda há "mais trigo do que joio", mais santidade do que pecado na Igreja.