Por Anna Fusina
ROMA, 20 de Junho de 2014 (Zenit.org) - Françoise
Dolto, famosa psicanalista francesa, argumentava que as crianças não nos
pertencem. Dizia que os pais deveriam ‘adotar’ os próprios filhos, mas que,
infelizmente, não o fazem, muitas vezes: “Nunca se tem um filho igual ao que se
sonhou, tem-se um certo tipo de criança e é preciso deixar que cresça segundo a
sua verdade: muitas vezes, em vez disso, fazemos o contrário”.
De acordo
com Andrea Canevaro, professor de Pedagogia na Universidade de Bologna, “uma
criança deve ser aceita por aquilo que é, e, ao mesmo tempo, deve ser
considerada por aquilo que ela será, muito além do que nós queremos que ela se
torne.”
A criança é uma pessoa ‘original’, ou seja, uma
pessoa que só poderá adquirir um pleno desenvolvimento se lhe for permitida a
aquisição de uma identidade própria, que a levará a tornar-se alguém “nunca
existido antes (nem sequer na imaginação de quem a ama ou a colocou no mundo ou
a sonha de acordo com modelos ideais percebidos como absolutos). Bons pais
respeitam o ‘projeto’ misterioso escondido na semente original de cada filho,
não o considera filho propriedade sua, mas ‘filho da vida’ mesma, daquela vida
onde terá que, um dia, inserir-se autonomamente e como protagonista,
abandonando a matriz psicológica dos pais, onde cresceu”.
Um provérbio de Quebec (Canadá) afirma que
"os pais só podem dar duas coisas aos seus filhos: as raízes e as
asas".
Ser pai e mãe é ‘estar ao lado’ do filho em todas
as fases do seu desenvolvimento: na primeiríssima idade, protegendo, guiando e
estimulando a criança para o conhecimento de si mesma e do mundo onde vive,
utilizando as superiores capacidades físicas e psíquicas das quais um adulto é
dotado; posteriormente, atuando como um apoio para a separação psicológica da
família e para as experiências de inserção gradual no ambiente extrafamiliar e
a aquisição da autonomia pessoal.
De acordo com Gloria Soavi, psicóloga e
psicoterapeuta, "a criança tem uma necessidade fundamental para poder
crescer de uma forma harmoniosa e desenvolver o seu potencial, e, para além de
toda categoria social, psicológica e pedagógica, pode-se resumir em uma única
necessidade primária (...): ser amada. Esta necessidade de amor é dividida em
diferentes ações; ser aceita, acolhida, cuidada, acompanhada, reconhecida nas
suas necessidades, reforçada nas suas expectativas e capacidades, tudo o que
lhe dá a possibilidade de criar um laço, que será o laço primário primária
sobre o qual, depois, construirá todos os laços sucessivos e com os quais se
enfrentará emotivamente por toda a vida. Quem é pai sabe de quantas atenções
constantes e coerentes no tempo, precisam os pequenos para crescer e para se
tornarem adultos equilibrados e suficientemente felizes. O essencial do ser
filho, portanto, está fundamentalmente na relação com os pais por meio da
construção deste laço único e complexo que se desenvolve ao longo da vida e que
modifica continuamente, mas permanece como essência, como raiz e se for
positivo como um recurso ".
É absolutamente necessário, portanto, que as
relações pai-filho sejam baseadas no amor incondicional pela criança. O amor é,
porém, um sentimento sujeito a alguns riscos: pode tranformar-se em
propriedade, egoísmo, chantagem, projeção de si mesmo sobre o outro. Também o
amor generoso, infinito, desinteressado de um pai e de uma mãe por um filho, pode,
em alguns casos, transformar-se em posse egoísta da criança, pode desembocar em
atitude autoritária, em controles obsessivos delas. O Cardeal Angelo Scola
observa que "a tentação de possuir, a de não permitir que a criança seja
profundamente ‘outra’, ou seja, verdadeiramente livre, ameaça constantemente o
amor paterno e materno. Aceitar o risco da liberdade dos filhos, de fato, é a
prova mais radical na vida dos pais: desejar-se-ia livrar os filhos de toda
dor, de todo mal. Esta dramaticidade, presente em toda relação humana, torna-se
especialmente aguda na relação pai/mãe- filho. O laço é, aqui, de tal forma
poderoso que dá a percepção de que, se o outro – o filho – se perde, me perco
também eu – mãe ou pai -. Então, torna-se forte a tentação de reduzir o filho a
si, fazendo-o uma espécie de extensão da própria pessoa”.
A criança, portanto, deve ser acolhida e amada
por si mesma e não pelas suas qualidades, a partir do momento em que existe a
sua presença na família. Os pais, ao doar-se ao filho, devem, às vezes, saber
‘renunciar a si mesmos’. A fecundidade é uma experiência de dom e de
‘autodesprendimento’. Ensina que perder para encontrar (Mc 8:35) é o segredo da
vida, sem a qual ela perde o seu significado. (...) O segredo da vida não se
encontra na própria vida, que deve ser mantida com todo cuidado: é preciso
renunciar a si para dar-se a alguém. Se a vida quer se encontrada deve ser
perdida no ato da liberdade que concorda com ela como a uma graça e a uma
promessa".
(Tradução Zenit)
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