
Este é um bom momento para falar abertamente de um assunto delicado.
Eu sou viciado. Aliás, você provavelmente também o é, prezado leitor.
Somos viciados em nossas telas. E o problema é grave. Uma média de todos
os usuários do app Moment, que calcula o uso diário do celular nos
iPhones em que está rodando, informa que passamos entre três e quatro
horas interagindo com o aparelho.
Um sexto do dia ligados em apenas uma das telas. Este vício é o tema de um livro que acaba de sair nos EUA: Irresistible: The Rise of Addictive Technology, do psicólogo social Adam Alter. Ou, em português, Irresistível, a ascensão da tecnologia que vicia.
Um vício, como Alter definiu para The New York Times,
é algo que fazemos e causa satisfação no momento imediato, é nocivo a
longo prazo, e, no entanto, continuamos a fazer de forma compulsiva.
Como sacar o celular à toa, toda hora. Ou disparar o primeiro episódio
de uma série, emendar no segundo, no terceiro. Uma das pesquisas
consultadas para o livro mostra que, em média, 70% dos espectadores que
assistem o segundo episódio de uma temporada até o fim não largam a
série antes do último episódio.
Steve Jobs, em uma de suas últimas entrevistas, disse que não
deixava os filhos usar iPhones ou iPads. Chris Anderson, ex-editor da
“Wired” e autor de clássicos do estudo da tecnologia como “A Cauda
Longa”, também é extremamente rigoroso com as crianças da casa.
Não é que tecnologia digital seja construída para viciar. Mas o
modelo de negócio que a sustenta é, quase sempre, diretamente
relacionado à quantidade de tempo que gastamos interagindo. Apps, redes
sociais, séries, tudo depende de muitas horas de uso num ambiente de
muita competição. Então se sofisticam, e sofisticam. Ganha quem consegue
o produto capaz de nos manter grudados nas telas. E grudamos. Alter cita características que produzem, em nossos cérebros, esse desejo de mais.
A primeira é o feedback. Basta pensar em como botões de
elevador são irresistíveis para crianças. Um clique e a luz acende. Você
faz algo, há uma resposta. É um lado primitivo do cérebro este que tem o
prazer secreto de ver um resultado para cada ação. E, quando o
resultado da ação é aleatório, o impulso de buscar pela resposta bate
mais forte. Como máquinas caça-níqueis em que puxamos a alavanca mais e
mais na esperança da consequência ideal. Apps e games são cuidadosamente
desenhados para ter estas pequenas consequências para cada ação para a
qual respondemos sem controle.
Metas claras são igualmente importantes. O número de pessoas
que termina maratonas na marca de 3 horas e 58 ou 59 minutos é muito
maior do que aqueles que chegam em 4 horas ou quatro e um. Porque a gana
de cumprir uma meta – fazer em menos de quatro horas os 42 quilômetros –
provoca algo em nós. Apps que impõem metas por completar são apps aos
quais costumamos voltar.
Assim, como, claro, sociabilidade. Do botão curtir à
existência de comentários, retornamos ao lugar que postamos a foto para
ver quem gostou, quem falou, queremos este retorno dos outros. Ansiamos
por ele. Para não falar da gameficação: distintivos, pontos, rankings de
usuários. Quanto mais aparecemos num ambiente, maior o reconhecimento
que temos, quanto mais jogamos, mais recordes batemos. É o truque das
companhias aéreas que fazem uma fila especial para clientes que voam
muito. É uma conveniência, mas também um status.
Do Facebook ao app de corrida, da organização do Netflix à do
Linkedin, todos os ambientes digitais em nossas telas são construídos
para que a gente volte. Funciona.
Pedro Doria
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